O que descobrimos
- Empreendedores e influencers que têm a renda baseada na publicidade e nas vendas pelas redes sociais correm risco de exaustão por conta do acúmulo de tarefas.
- Além de todas as ações e investimentos para realizar as vendas, há o risco de ser “cancelado” pelo público ou repentinamente banido pelas próprias empresas de tecnologia.
Tempo precioso
O documentário “O dilema das redes” acabou se tornando um incentivo importante para que a astróloga e influencer Isabella Mezzadri tomasse uma decisão que já vinha amadurecendo havia alguns meses: deixar o Instagram, o que significou abandonar um perfil de sucesso, com mais de 300 mil seguidores.
“Já são quase sete anos de forma super presente aqui sem nunca ter me permitido tirar um pequeno break”, ela explicou aos seguidores quando anunciou a decisão de cancelar o perfil, que vinha sendo um apoio importante para a sustentação financeira das atividades profissionais de Isabella.
Ao compartilhar que sentia a necessidade de ressignificar a presença nas redes sociais, ela deixou um alerta aos seguidores. “Queria incentivar vocês a refletirem também sobre como têm usado o tempo de vocês, onde estão colocando energia… Porque nosso tempo – e nossa vida – é preciosa demais”, escreveu.
Alto risco
Depender das redes sociais significa, na maioria dos casos, viver sob tensão constante. Além da compulsão para acompanhar os números e a repercussão das publicações, há o receio permanente de que algo seja mal compreendido. Um dos grandes fantasmas de quem vive das redes sociais, hoje, é ser “cancelado” por algo dito ou feito.
Isabella se diz aliviada pela decisão de sair do Instagram, pois vinha se sentindo incomodada ao perceber como os dois lados do balcão – tanto os produtores quanto os receptores de conteúdo nas redes sociais – vinham demonstrando cada vez mais ansiedade e outros efeitos negativos para a saúde mental.
Os brasileiros são especialmente suscetíveis a esses riscos, por conta do alto nível de uso. De acordo com pesquisa da consultoria inglesa GlobalWebIndex, o país tem a segunda maior média de tempo diário conectado às redes sociais – três horas e vinte e cinco minutos.
Capacidade crítica
Reflexões como as feitas por Isabella estão sendo motivadas pela pandemia, considera a psicanalista Sandra Edler, autora do livro Tempos compulsivos. “Muitos ganharam uma pausa para sair das atividades automáticas e refletir sobre suas questões”, ela avalia.
Por outro lado, adverte a psicanalista, há pessoas que, privadas dos escapes naturais – especialmente sair de casa –, ampliaram o tempo de permanência na internet. “Cresceu muito o número de compulsivos digitais, com lamentáveis consequências. Toda compulsão preocupa porque tolhe ainda mais a já restrita liberdade do sujeito”, diz Sandra.
Ela lembra que a tecnologia é extremamente sedutora sob vários aspectos e considera que não há como esperar que o território digital não se mantenha em expansão. Propõe, no entanto, uma série de reflexões. “Devemos legar ao algoritmo, à inteligência artificial, a possibilidade de decidir, de escolher por nós? Vamos abrir mão de nossa capacidade crítica? Vamos consentir em fazer parte do imenso rebanho de domesticados por uma ferramenta que criamos?”
Fora do jogo
Outro risco para empreendedores e influencers é serem atingidos por decisões unilaterais das grandes empresas de tecnologia. Foi o que aconteceu em meados de outubro com Vinícius Teles e Patricia Figueira, que formam o Casal Partiu, nômades digitais que têm como principal atividade profissional a venda de cursos sobre diferentes aspectos desse estilo de vida.
Eles tiveram a página no Facebook repentinamente bloqueada, sem qualquer aviso prévio ou explicação. Com isso, as atividades no Instagram também foram atingidas, pois as duas redes sociais pertencem ao mesmo grupo.
A consequência para o faturamento foi desastrosa, já que a maioria dos participantes dos cursos eram conquistados por meio de anúncios impulsionados nas duas redes. “Ainda estamos sem entender o que aconteceu, pois não conseguimos uma resposta. Não mudamos a forma de agir que vínhamos adotando nos últimos três anos.”
Julgamento sumário
O episódio lembrou outra passagem semelhante ocorrida com o casal há dez anos. Em 2008, Vinícius havia desenvolvido um aplicativo para profissionais que trabalhavam na organização de casamentos. O aplicativo usava um recurso de integração da plataforma Flickr para o armazenamento de fotos.
Mais de dois anos depois, no entanto, o Flickr decidiu bani-los, de forma sumária, sob a alegação de desobediência às políticas do serviço.
Na ocasião, Vinícius e Patricia aprenderam algumas coisas que estão constatando novamente agora. Uma delas é que os termos de uso das plataformas costumam ser redigidos de forma imprecisa e ambígua, dando margens a diferentes interpretações. Outra: é quase impossível estabelecer contato e negociação com as grandes empresas de tecnologia.
Casa própria na internet
O consultor Fernando Souza diz que é fundamental abrir o leque de possibilidades para não ficar tão dependente das mídias sociais. “Para pequenos e médios empreendimentos, o local mais acessível para investimentos em promoção, marketing e divulgação acaba sendo as mídias sociais. Mas há um grande número de canais possíveis, tanto online quanto offline.”
Ter um site bem desenhado e bem posicionado nos buscadores é muito importante, observa o consultor. “Pode até parecer antiquado para alguns, mas o site é a sua casa própria na internet, o seu porto seguro, é onde você tem autonomia para a gestão do ambiente. Um site forte é um ponto de contato com os clientes e diminui a dependência das mídias sociais.”
Outra providência fundamental, ressalta Fernando, é construir uma boa base de CRM (Customer Relationship Management, Gestão de Relacionamento com o Cliente), com informações-chave de contato que podem ser trabalhadas de outras formas além das redes sociais. Assim, boa parte das novas vendas pode se originar do público já conquistado, seja por ação direta dos clientes ou por indicações desses.